domingo, 16 de setembro de 2012


A Educação Já Possui Respostas, Prioridade Política dos Governantes

Qualquer sociedade que se preze tem a educação como umas das prioridades dos seus governantes. Na cultura dessas nações esse tema é concebido como área estratégica do Estado, que é pensada e articulada com as demais políticas públicas, como saúde, segurança, saneamento, seguridade social, etc. Portanto, é o Estado como organização o principal provedor e gerenciador do sistema educacional, cujos recursos públicos devem atender a educação a partir da mais tenra idade e se estendendo até o nível superior. Realidade essa nada comum no Brasil e em inúmeros países latinos americanos, cujas culturas foram profundamente influenciadas pelas do colonizador europeu.
O Brasil, como país colonizado pelos portugueses, foram necessários aproximadamente quatrocentos anos para que se estabelecessem as primeiras políticas públicas de estruturação do ensino. Em Santa Catarina, as primeiras leis criadas para a regulação do ensino público elementar correu em 1836. Mas foi no século XX, em 1910, que se instituiu a grande reforma educacional catarinense, estabelecendo normatizações  acerca do currículo e a profissionalização do magistério, garantindo aos educadores alguns parcos benefícios. Mesmo com tais avanços institucionais, o sistema educacional público, manteve atrelado às estruturas arcaicas de um Estado viciado e controlado por uma elite provinciana cujo magistério se constituía num dos principais pilares de perpetuação no poder.
Acreditava-se que essas práticas politiqueiras na educação fosse rechaçada pela população  com o fortalecimento dos princípios republicanos. Com a chegada da década de 1960, no regime político de João Goulart foi desencadeada uma grande mobilização nacional em prol da educação pública cujo articulador foi o então educador e ministro da educação de Goulart, Paulo Freire. No entanto, tal utopia revolucionária não se concretizou, pois em 1964, os militares, mediante golpe, assumiram o controle do Brasil. Foram aproximadamente vinte anos de retrocesso. Tempo no qual se imaginava que seria recuperado com a redemocratização política, consolidada com a promulgação da constituição de 1988 e com a institucionalização da Lei de Diretrizes e Base de 1996.
Um sentimento de esperança brotava nos corações e mentes dos educadores, pois as promessas que ecoavam nos quatro cantos do território brasileiro eram de que a educação, finalmente, tornar-se-ia a meta número um dos governantes do século XXI. E não poderia ser diferente. Para um país que aspirava ocupar as primeiras posições entre as  potências econômicas, a educação deveria realmente ser pensada como prioridade.
O estado de Santa Catarina, acompanhando a locomotiva Brasil, deveria agora promover suas reformas adaptando-se a legislação federal. Para os governos de plantão, atendendo o clamor dos educadores e dos movimentos populares, promoveu ampla reforma na estrutura curricular adotando como referencial teórico educadores e intelectuais de vertentes marxistas, dentre eles Vigotsky, Vallon e Paulo Freire. Estaria o governo interessado em minar as estruturas do sistema capitalista ou apenas conquistar a simpatia dos educadores e, principalmente, desviar o foco dos movimentos populares?  Mesmo com a efetivação das reformas, as transformações desejadas pelos educadores   não se concretizaram, suas condições de trabalhos e salarial mantiveram-se inalteradas. Isso já era de se esperar, pois a estrutura e organização educacional continuaram atreladas ao estado, ou seja, ao partido ou partidos que integram sua base de sustentação.
Com a chegada do século XXI o desmantelamento do sistema educacional público continuou acelerado, muitas vezes patrocinado pelos governos federais que disponibilizavam e vem disponibilizando cada vez menos recursos para educação. Ao mesmo tempo, os estados, seguindo as mesmas linhas de contenção de despesas, promovem um processo de descentralização educacional, transferindo para as esferas do poder municipal a responsabilidade para com o ensino fundamental. Num país como o Brasil onde o controle político e administrativo dos municípios ainda se mantém atrelado grupos oligárquicos  e partidos cujo processo de eleição de seus prefeitos e vereadores, com raras exceções, transcorrem da mesma forma como no início do século XX, há de se imaginar que a municipalização seguirá a mesma lógica do passado, ou seja, a partidarização de sua estrutura de comando e ensino. São raros os  municípios cuja gestão da educação tem ampla participação da população.
O processo educacional em curso no Brasil é muito mais complexo que pode se imaginar. Não são políticas descentralizadoras que reverterá o quadro caótico do ensino. A educação tem que ser pensada como área estratégica, envolvendo não apenas o Ministério da Educação, como os demais ministérios, o legislativo, judiciário e os seguimentos sociais organizados e com investimento pesado, não os parcos 5% do PIB que vem sendo aplicado e com perspectiva de elevar a 10% nos próximos dez anos. Países como Coréia do Sul, Japão, Suécia, entre outros, participam com cifras muito maiores que a brasileira, alcançando patamares superiores a 25% do PIB.
Outro dado alarmante é com relação à participação do PIB em seguimentos sociais cujas cifras escancaram a realidade brasileira que o torna um dos países mais desiguais do planeta. Pois vejamos, no setor previdenciário, a participação do Estado é de 12%; saúde 3,5%; habitação – urbanismo e saneamento 2,2%; assistência social – bolsa família 1,3%; poder judiciário 1,7%; segurança  Estado 1,1%; cultura – ciência, desporto e lazer 0,6%; poder legislativo 0,5% e forças armadas 1,6%.
Se somarmos esses valores, o gasto do PIB atinge um patamar de 32%, muito inferior aos aplicados por países como França, Bélgica, Suécia, Dinamarca, Finlândia, que ultrapassam a 50%. Setores como Educação, saúde e previdência exigiriam gastos públicos adicionais da ordem de 12% a 13% do PIB, que somados aos valores atuais, totalizariam 45% do PIB. Portanto, a educação pública não precisa de respostas, o que queremos é que os governantes removam as máscaras e falem a verdade, esclarecendo que a mesma não é prioridade, se fosse os investimentos seriam maiores que os aplicados atualmente. Mesmo com baixos investimentos, os recursos disponibilizados à educação enfrentam outro problema crônico, os recursos não chegam ao seu destino e quando chegam encontram estruturas administrativas viciadas, dominadas pelo clientelismo e corporativismo.
Em 2010, o gasto público em educação foi de R$ 3,5 mil por aluno, bem inferior aos aplicados por países como Argentina, Chile e México. É importante frisar que os 3,5 mil aplicados na educação pública brasileira referem-se apenas ao ensino básico, até quatorze anos. Não inclui  gastos com o ensino superior, que atinge cifras de 17,9 mil para cada universitário. Portanto, os estudantes do ensino fundamental e médio receberam cinco vezes menos que os do ensino superior. Afinal quem estuda nas universidades públicas e que estuda nas escolas públicas brasileiras?
Enquanto no Brasil o gasto por aluno é equivalente a U$ 2.416.10, a Coréia do Sul que é a vigésima classificada entre as  piores que investem em educação, a mesma aplica R$ 7.434.46; a quinta colocada é a Dinamarca, U$ 11.787.86; quarta, Áustria, 11.851,57; terceira, Noruega, 13.284.82; segundo, EUA, 14.922.76 e primeiro a Suíça, 14.976.81. Em relação à remuneração do profissional da educação que deveria ser a principal prioridade dos governantes brasileiros, a mesma não está inserida nas políticas reformistas em curso para o ensino básico, mesmo com a promulgação de uma Le em 2008i instituindo o piso nacional do magistério. Desde a sua promulgação  e com forte pressão da categoria mediante longas paralisações das atividades, poucos são os estados que vem cumprindo precariamente a lei. Alegam os mesmos que  a legislação do piso é inconstitucional por estabelecer índices incompatíveis com a capacidade orçamentária dos estados. Tentando reverter o processo, estados como Rio Grande do Sul, São Paulo, Santa Catarina e outros, entraram com uma Adin, Ação de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal para  a revogação da lei, restabelecendo o sistema de reajuste aplicado anteriormente, o INPC.  (Índice Nacional Preços ao Consumidor).
Mesmo com o a sanção e aplicação da Lei do Piso, a remuneração do magistério público brasileiro mantém-se vergonhosa em comparação aos salários pagos aos profissionais da educação de outros países. Com base no OCDE (Organização para Comparação e Desenvolvimento Econômico), remuneração anual dos (as) professores (as) brasileiros (as) é de R$ 9,8 mil; Chile – 15,6 mil; México 15,6 mil; França 24 mil; Turquia 25,5 mil; Coréia do Sul 30,5 mil; EUA 36,5 mil; Alemanha 46,4 mil; Suíça 48,8 mil; Luxemburgo 51,7 mil. Com tais índices fica fácil avaliar o grau de satisfação dos educadores que atuam nas escolas públicas de um país classificado como sexta economia do planeta, a frente de países como Inglaterra e outros acima citados que remuneram e valorizam seus profissionais muito melhor que o Brasil. O descrédito dos administradores públicos com a educação reflete diretamente no envolvimento das famílias brasileiras em relação às escolas na qual estudam seus filhos. Em pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa IBOP, chegou-se a conclusão que 72% das famílias se dizem satisfeitas com a educação nacional, concedendo nota sete (sete) para as escolas públicas e privadas.
O que é estarrecedor é a constatação de que 70% da população brasileira desconhecem as políticas adotadas pelos prefeitos para a melhoria do ensino; 1% dos eleitores considera as propostas de educação determinante na hora do voto; 89% não consideram a educação como principal problema do país; 20% acreditam que a educação é também responsabilidade da população; 7% acham que educação é responsabilidade dos pais e 68% pensam que é responsabilidade do governo. Os números acima dão uma dimensão do problema que pode se tornar crônico e que a solução não está apenas na implantação de leis ou reformas paliativas. É preciso atacar a raiz do problema a partir de uma grande mobilização da sociedade e de investimentos pesados, que devem ultrapassar urgentemente os 10% do PIB, porém com forte fiscalização para que os recursos não se diluem antes de chegar ao destino.  
Diante de uma realidade perversa onde governos, sutilmente, utilizam-se da mídia para divulgar imagens românticas e positivas da educação pública, a UNESCO, em 2011, laçou dados de uma pesquisa envolvendo 127 nações, cujo objetivo era avaliar a capacidade dos (as) estudantes  do ensino básico. O resultado colocou o Brasil na posição 88º lugar; nas áreas de leitura e ciência a colocação foi 53º. Dos 65 países pesquisados nas áreas de matemática o Brasil ocupou a 57ª colocação.
Tais números são reflexos do que vem ocorrendo no ensino superior brasileiro e especial nas licenciaturas. Enquanto que em 2005, o número de matriculas nas licenciaturas era de aproximadamente 1.250 milhão, cinco anos depois esse índice caiu para 928 mil, ou seja, 322 mil vagas a menos. Portanto como preencher as vagas disponíveis nas escolas? A resposta é obvia os (as) professores (as) para preencherem suas cargas horárias são submetidos a lecionar disciplinas sem que apresentem a mínima qualificação para o exercício. Situação essa que é impensável em profissões como direito, medicina, engenharia, etc. Na cabeça dos nossos governantes, qualquer um (a) pode ser professor (a).   É inegável que tais índices de abandono das licenciaturas tendem a aumentar, principalmente quando foi noticiada a aprovação do novo PNE (Plano Nacional de Educação), para os próximos dez anos quando o valor do PIB destinado a educação chegará a 10%. O que realmente preocupa os (as) educadores (as) são as ADINS (Ações de Inconstitucionalidades) encaminhadas pelos governadores tentando revogar a lei do piso, que pode tornar o magistério profissão sem professores ou, aqueles que ousarem seguir, exercerão sem nenhum estímulo.
Além da pesquisa lançada pela UNESCO colocando o Brasil numa posição ridícula no cenário mundial, na segunda metade de 2012, foram publicado os resultados do IDEB (Índice de Desenvolvimento do Ensino Básico), escancarando ainda mais o caos educacional brasileiro. A luz vermelha acendida motivou o governo federal a promover medidas emergenciais, porém paliativas, para  reverter o buraco negro na qual a educação está prestes a ser inserida, dentre elas uma profunda reforma curricular, admitindo que o problema estivesse no excessivo número de matérias ou disciplinas na qual os (as) estudantes terão de dar conta e não no modelo de ensino adotado, fragmentado e desconectado com a realidade dos (as) estudantes. As propostas de reformas no campo curricular tiveram como motivador  os números do ideb cuja maior deficiência foi constatada nos (as) estudantes matriculados (as) nas fases de transição dos oito e nove anos, período com  maior diversidade de disciplinas e professores. Sendo assim a reforma tem como propósito substituir o modelo tradicional, por disciplinas,  por outro mais dinâmico que receberá a denominação de áreas temáticas.
A contradição quanto à reforma que está sendo cogitada, principalmente em se tratando de Santa Catarina é que desde a década de 1990, vem sendo discutido com os educadores uma nova proposta curricular, de cunho marxista, que teria como propósito desconstruir o modelo tradicional de ensino, fazendo com que os profissionais da educação participassem da elaboração de um projeto político pedagógico, em conjunto com a comunidade, definindo o tipo de  escola que se deseja e a forma como deve ser mesma deveria ser gerida.   Não haveria necessidade, portanto, de novas reformas, cardápios de disciplinas e outros absurdos. O que deve ocorrer e é simples, é o envolvimento da sociedade, discutindo os problemas da escola e os caminhos que devem ser tomados. O que não é aceitável é que representantes ou secretários do governo catarinense ocupem espaços da mídia para expressar absurdos como este: “a escola tem muitos projetos, ela deve concentrar naquilo que é fundamental, que  possa gerir recursos e definir os projetos que deseja aplicar, ampliar a autonomia”. O que causa revolta é que debates importantes como esse, excluíram-se a participação de entidades que representam os educadores, deixando claro que a educação, seus problemas e soluções são decididos por uma elite, cujos filhos, netos jamais pisaram numa escola pública.
Como afirmar que há muitos projetos nas escolas se a mesma continua engessada a um programa arcaico, conteudista e excludente, cujos professores são forçados a ocuparem cargas horárias desgastantes, se deslocando de uma escola a outra, muitas vezes não conhecendo os próprios colegas de trabalho muito menos os alunos e tendo que optar por uma das escolas quando da realização de reuniões pedagógicas. É nítido o desconhecimento dos nossos governantes quanto ao funcionamento das unidades de ensino. Há projetos sim, inovadores, que estão sendo desenvolvidos com empenho de professores e estudantes, que com muito esforço e dedicação conseguem uma pequena brecha de suas atividades formais e vão a campo  pesquisar, conhecer a realidade das comunidades, dos bairros, do próprio município, trazendo os problemas para escola e inserindo-os nos currículos atendendo as prerrogativas dos Projetos Políticos Pedagógicos. São casos isolados é claro, que passam despercebidos das próprias gerências educacionais, porém influenciam intensamente na melhoria do desempenho dos estudantes.    
Mas, não é esse o modelo de educação pensada pela elite míope que comanda a estrutura econômica e educacional brasileira. Qualquer país que obteve desempenhos expressivos no seu PIB sempre esteve associado em investimentos proporcionais na área social, especialmente em educação. No Brasil, o processo segue caminho invertido, pois embora tenha conquistado um posto de  sexta economia mundial, esse mesmo posto não reflete em ganhos sociais, que coloca a educação brasileira entre as 88 piores do planeta. A reversão desse processo se dará com investimentos pesados e com a ampliação do Estado, melhorando a eficiência dos serviços prestados às camadas mais necessitadas da população, combatendo disparidades salariais, à corrupção e o desvio de recursos. Não se pode cair na armadilha  preparada por setores da elite, atrelados ao próprio Estado, que promovem campanha utilizando-se da  mídia tentando  denegrir a figura do Estado, resultando em descrédito por parte da população.
Em países mais sérios o Estado sempre foi um elemento primordial de fomento das políticas de crescimento e desenvolvimento social. Sua ampliação e eficiência tornaram-se essenciais para a elevação do PIB e a melhoria de qualidade de vida da população. Nos países pobres como o Brasil a necessidade do setor público deve ser maior que nos países ricos. Portanto, a causa da pequenez do setor público e também a pequena carga tributária, está vinculada aos baixos valores das alíquotas de impostos, a grande sonegação e a evasão fiscal consentida. Esse demonstrativo explícita os motivos da modesta participação do PIB brasileiro em serviços essenciais. Observem que quase a totalidade dos candidatos que concorrem às vagas para o executivo e legislativo dos municípios brasileiros possuem o mesmo discurso, projetos de melhoria dos serviços básicos. São discursos vazios que não correspondem à realidade, pois como viabilizar tais promessas quando o Estado federal limita cada vez mais os recursos do PIB, deixando a saúde e principalmente a educação em um estado de penúria absoluta.   
Prof. Jairo Cezar